GPS na imprensa

O gado tem mais luzes do que sombras

producción sostenible

Ernesto Viglizzo, La Nación (Argentina), 25 de junho de 2022.

À medida que o conhecimento científico avança, o verdadeiro papel da pecuária na emissão de gases de efeito estufa pode ser elucidado em relação a outros setores da economia.

Assim que a FAO publicou "A longa sombra do gado" em 2006, as vacas caíram sob um manto de suspeitas e as críticas choveram sobre elas. Entre outras calamidades, tentou-se mostrar que os gases emitidos pelo gado eram os principais fatores do aquecimento global e das mudanças climáticas. Seus autores cobraram as emissões de outros setores não agrícolas, como fabricantes de insumos, transportadores, frigoríficos, distribuidores varejistas, vendedores, etc., na "conta de carbono" do gado.

Embora o cálculo atribuísse 18% das emissões globais às vacas, um recálculo posterior (2013) reduziu esse número para sugestivos 14,5%. Apenas um passo interveio entre esses números e o início de uma campanha agressiva para reduzir o consumo de carnes e laticínios.

Hoje detectamos inconsistências nesses relatórios: se os inventários nacionais atribuem emissões às indústrias que realmente as produzem, não é lícito atribuí-las paralelamente à pecuária. Seria um caso de contabilidade duplicada. Quando essa duplicação é omitida e apenas as emissões biogênicas do gado (de origem metabólica) são computadas, esse número cai para menos de 5%. Além disso, esse percentual tende a diminuir ano após ano, devido ao aumento do consumo de combustíveis fósseis. Que lição fica para nós? Que o método de cálculo determina o número e que o número pode enganar a opinião pública.

Sabemos que o metano emitido pelos ruminantes é um poderoso gás de efeito estufa. Publicações recentes diferem em suas estimativas, mas o gado emitiria entre 17 e 24% das emissões globais. O resto viria de outras fontes. No meio disso, há duas coisas a esclarecer:

  • Enquanto outros gases de efeito estufa (como dióxido de carbono e óxido nitroso) podem persistir na atmosfera por décadas ou mesmo séculos, o metano decai e perde seu potencial de aquecimento em cerca de dez anos. Isso significa que a persistência dos gases não é comparável e que uma correção dos cálculos é inevitável.
  • O gado sintetiza o metano emitido a partir do carbono que já estava no ar, e que antes era capturado por meio da fotossíntese pelas plantas que consome. O gado não adiciona mais carbono à atmosfera; ele simplesmente recicla o que já existia. O contrário ocorre nas indústrias que queimam combustíveis fósseis: ano após ano adicionam novos volumes de carbono à atmosfera, sem intermitência. As estatísticas comprovam: em 1995, cerca de 17% das emissões globais vieram do setor rural; em 2021 esse número caiu para menos de 7,5%. Dos 92,5% restantes, quase 70% são provenientes de indústrias que dependem de energia fóssil. Cuidado, então, com estratégias que desviam o foco dessas indústrias para a pecuária!

A pegada de carbono, que mede a emissão por kg de produto, é outra noção a ser revisada. O método sempre produz uma assimetria que se repete: um quilo de carne bovina pode emitir entre 40 e 70 vezes mais carbono do que um quilo de grãos ou outros produtos vegetais. Esse contraste afeta a reputação do gado. Mas se ao invés de usarmos o kg de produto como unidade de referência, calcularmos as emissões por hectare produtivo, a divergência entre produtos bovinos e vegetais pode ser bastante alterada. Novamente, os resultados variam dependendo do método aplicado.

Do ponto de vista doméstico, é pertinente nos perguntarmos quanto as vacas argentinas emitem e quanto elas influenciam o aquecimento global? De acordo com estatísticas globais de 2019, o gado argentino emite aproximadamente 0,16% das emissões globais. Estando bem abaixo de 1%, fica claro que sua influência no aquecimento global é insignificante. Que sentido prático faria diminuir a população bovina em um país que se alimenta e dela gera divisas?

Emissões

O que foi dito até agora conta parte da história: a das emissões. A outra parte nos obriga a olhar para o carbono capturado em nossas extensas terras de pecuária. Nosso país possui uma gigantesca plataforma de fotossíntese capaz de capturar e acumular carbono orgânico na biomassa da vegetação e no solo. 

Como temos poucas medições de campo, por enquanto só podemos trabalhar com hipóteses. Mas não devemos nos surpreender com um saldo líquido positivo se o sequestro e a acumulação de carbono em terras rurais excederem suas emissões. Há um desafio metodológico a explorar.

Em suma, a longa sombra do gado diminui cada vez que a ciência ilumina coisas novas.À medida que aprendemos, percebemos que os métodos de inventário de carbono não são totalmente resolvidos e produzem incerteza. Embora nosso país apresente estoques ajustados a uma metodologia internacionalmente aceita, esses números não refletem necessariamente a realidade da pecuária argentina. O impacto real do metano no aquecimento global e o sequestro de carbono em nossas pastagens são duas questões pendentes. À medida que o debate continua, o agricultor preocupado com as emissões de suas vacas pode ser aconselhado a não assumir a priori culpa por pecados que não cometeu..